sábado, 8 de outubro de 2011

A anencefalia e o aborto

Fim de período sem muito tempo pra escrever, então resolvi postar esse trabalho da facul (meu e de alguns colegas), pois é um tema que além de interessante, deve ser bastante discutido.

A anencefalia consiste em uma má-formação congênita que atinge cerca de um em cada mil bebês. A palavra significa “sem cérebro”, mas essa expressão não é apropriada, pois nessas situações faltam ao bebê atingido algumas partes do cérebro, enquanto outras garantem as funções vitais do organismo. Essa patologia afeta a configuração encefálica e a dos ossos do crânio que rodeiam a cabeça do bebê. A anencefalia incide em uma má formação rara onde há o fechamento do tubo neural acontecido entre o 16° e o 26° dia de gestação. Esta é a malformação fetal mais freqüentemente relatada pela medicina.

Quando um bebê anencéfalo sobrevive após o parto, terá apenas algumas horas ou alguns dias de vida. O feto anencéfalo é gravemente deficiente no plano neurológico. Faltam-lhe as funções cerebrais correspondentes aos fenômenos da vida psíquica, sensibilidade, a mobilidade, a integração de quase todas as funções corpóreas. Um feto anencefálico não usufrui de nenhuma função superior do sistema nervoso central "responsável pela consciência, cognição, vida relacional, comunicação, afetividade e emotividade."

O risco de incidência dessa patologia aumenta 5% a cada gravidez seguinte. Inclusive, mães diabéticas têm seis vezes mais probabilidade de gerar filhos com este problema. Há também maior incidência em mães muito jovens ou de idade avançada. Uma das formas de prevenção mais indicadas é a ingestão de ácido fólico antes e durante a gestação. A anencefalia é letal em 100% dos casos.

Apesar de a gravidez poder ser levada adiante normalmente (pois a saúde da mãe não corre risco diferente que em gestações de bebês saudáveis), muitas vezes as mães são aconselhadas a interromper a gravidez. No Brasil a interrupção é crime, pois o aborto só é permitido legalmente em duas condições: quando a gravidez resultou de um estupro ou quando a vida da mãe está em risco. Entretanto, alguns juízes já deram autorização para que isso acontecesse de forma legal, mas essas decisões, como se é esperado, causam polêmica e são alvo de discussões.

O ABORTO

O aborto de fetos anencéfalos é de bastante controvérsia e divide a opinião da sociedade. Mas, polêmico ou não, o assunto é de bastante relevância e merece ser discutido com atenção para assim formar-se um parecer oficial e legal para regular as situações em conflito. Iremos expor então, os dois lados dessa problemática.

As pessoas que defendem a interrupção da gestação usam de alguns argumentos com base, por exemplo, no bem-estar psicológico da família da criança. A Lei 9.434 de 04 de fevereiro de 1997, que é a lei de Transplante de Órgãos, é usada como respaldo para justificar tal ato. Assim como só é possível a retirada de órgãos após a morte encefálica do paciente, como o legislador aceita a morte encefálica do paciente como prioridade para o transplante, e não a consente no caso do feto anencefálico? É uma contradição. Outras pessoas acreditam que a gestação de feto anencefálico é conflitante, uma vez que, tal prática, além de não trazer em hipótese alguma possibilidade de longa vida ao feto, gera danos à saúde da em virtude do alto índice de óbito intra-uterino desses embriões. Até porque, desde 1968, o Comitê da Escola de Medicina de Harvard, concluiu que o coração deixou de ser o órgão central da vida e a falta de batimentos cardíacos, a significação da morte. Elegeu-se, em troca, o cérebro, de forma que a morte passou a ser definida como a abolição total da função cerebral. Dessa forma, é arriscado insistir em continuar com uma vida que não possui sua completa atividade cerebral e que de certo não irá sobreviver. Há que se preocupar também com a mãe, pois a gravidez não é um episódio desimportante na vida de uma mulher. É algo que lhe acarreta a transformação total de seu ser. Segundo Pámela Chavez Aguilar:

“É uma duplicação: um fazer-se dois: outra pulsação e minha pulsação, outra respiração e minha respiração. Já não é a mesma porque não é uma; é ela transformada em dois. Junto a outro que agora é uma pulsação, uma respiração, mínimos sinais vitais (…) Estar grávida não é pois assunto trivial. Nem enfermidade, nem assunto de órgão corpóreo: é uma situação existencial – limite que coloca a mulher diante do supremo mistério de ser um e ser com outro. Desta forma, o embrião aparece para a mãe como um ser-outro-formando-se-dentro-do-corpo materno”.

Há de se observar que na anencefalia, não há o pressuposto da vida, mas apenas da morte. Vale, contudo, ressaltar que o conceito de saúde, enquanto direito fundamental de acordo com a Constituição (art. 196) não se limita apenas à saúde física. A OMS (Organização Mundial da Saúde) define a saúde como o estado de completo bem estar físico, mental e social. E nos casos de anencefalia, a saúde psíquica da mulher passa por graves perturbações. O diagnóstico da anencefalia já provoca inquietação no núcleo familiar. Bem como a depressão, frustração, tristeza e angústia. A gestante se vê obrigada à torturante espera do parto de um feto irrealizável. Vale lembrar também que se o aborto fosse um dia aceito pelo nosso ordenamento, a mãe teria a faculdade pra escolher se queria ou não interromper a vida do feto, assim como nos outros casos que hoje são permitidos, ela não seria obrigada a fazer tal ato.

Já outras pessoas, acreditam que a mãe deve zelar pelo seu filho e mesmo nessas situações prosseguir com a gestação. Um dos argumentos iniciais é sobre o Código Civil brasileiro, no artigo 2º, que declara que “a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro”. Nos bebês anencéfalos, apesar da deficiência no cérebro, todos os demais órgãos funcionam, devendo-se esperar, pois, que a morte, em seu devido tempo, aconteça, e não que se interrompa sua vida. Existe também o artigo 1º da nossa Constituição que expõe o “princípio da dignidade da pessoa humana” que assegura que o bebê tenha sua vida respeitada, uma vez que esta é um direito fundamental e essencial. Outro ponto importante a ser observado é esse tema sob a ótica dos religiosos, os quais exercem uma pressão muito grande junto aos políticos e até mesmo perante os juízes. Os religiosos são claramente contra o aborto, quaisquer que seja a situação. Para eles a questão ultrapassa os limites da medicina e o que lhes interessa é a vida, pois o aborto é um assassinato e isso é pecado.

No Brasil, o Código Penal define o aborto como crime contra a vida, com exceção em duas hipóteses: quando a gestação é decorrente de estupro ou quando a vida da mãe corre risco. Como a gravidez de um nascituro anencefálico normalmente não é resultado de estupro nem implica risco para a vida da mãe, o aborto neste caso é proibido pela lei. Entretanto, alguns juízes entendem que a mulher tem o poder de decisão sobre seu corpo e sobre a vida de seu filho, e essas jurisprudências vêm ocorrendo a favor da interrupção da gravidez. A LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) estabeleceu no seu artigo 4° que quando a lei for omissa, o juiz decidirá de acordo com a analogia e os princípios gerais do Direito. E no artigo subseqüente: "Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".

Por fim, os Três Poderes do nosso governo devem unir-se para discutir e decidir sobre esse tema, diante das lacunas existentes no Direito e devido a novos problemas que surgem a cada dia, com a evolução dos tempos. São vidas que estão em jogo, da mãe, do pai, do bebê e de toda uma família. Em muitos países essa situação já foi legalizada e o aborto aceito como em alguns países da Europa, no Canadá, em Cuba e na China. A proibição ou não do aborto das crianças com anencefalia deve ser resolvida e legalizada para que a família e o médico não fiquem dependentes dos valores, opiniões e do caráter dos juízes envolvidos nos casos.

Um comentário:

  1. Blog encantador,gostei do que vi e li,e desde já lhe dou os parabéns, também agradeço por partilhar o seu saber, se desejar visitar o Peregrino E Servo, ficarei também radiante
    e se desejar seguir faça-o de maneira que possa encontrar o seu blog, porque irei seguir também o seu blog.
    Deixo os meus cumprimentos, e muita paz.
    Sou António Batalha.

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